Por Maria Teresa Ferreira – Projeto Enegrecendo:
A nova onda do coronavírus tem nos mostrado que pouco aprendemos com o ano que passou. O mundo, ainda vive um hiato entre o que era conhecido e o que será preciso construir em relação sociedade. Esse é o recado da pandemia, essa continua a ser é nossa lição de casa, mas por onde começar? Se as lições do ano que passou não foram digeridas?
Se formos procurar os culpados podemos começar sendo generosos, pelo feudalismo, fazendo uma alusão ao gérmen da propriedade privada. Pensando melhor, antes dele talvez. Responsabilizar a hegemonia heteronormativa da história, também pode parecer uma boa opção a ser percorrida. A escravidão, as guerras, as ditaduras, o holocausto, a bomba atômica e todas as outras as grandes catástrofes que assolaram a Humanidade, são outras alternativas que podem ter nos trazido até aqui.
A humanidade gestou o Covid-19 e como todo processo de gestação uma hora, a criança nasce e esse bebe nasceu bastardo, porque ninguém o quer. De pai e mãe indefinidos, ele corre o mundo e de boca em boca. Vão dizendo uns aos outros:
– Fiquem em casa, ele pode te pegar!
Isso me lembra o sítio do Pica Pau Amarelo. A música da Cuca “cuidado com a Cuca que cuca te pega”, a diferença é que a Cuca ainda que tenha assustado muita gente, era um personagem que vivia no mundo do imaginário. Aconchego de colo materno, acolhia o pequeno assustado e afastava o sinistro bicho esverdeado.
O personagem do momento é invisível aos olhos. Ele vive nos botões dos elevadores, no corrimão dos prédios, nas cédulas de qualquer valor, no saco de pão, no chão que pisamos, no ar, a gente nem sente ele chegar. A Cuca, grande e pesada onde quer que passe pode ser vista e afugentada o coronavíris não. Nós e a Cuca estamos sucumbindo dia após dia, ainda sem saber para onde ir e nem o que fazer, com todas as questões que vieram à baila.
O rastilho de pólvora que a Covid-19 deixa atrás de si são questões sociais e principalmente econômicas que já deveriam ter sido repensadas e por incrível que pareça, novamente patinamos nas soluções que poderiam garantir a vida e a sobrevivência da população.
Falhou a dinâmica do ditado: trocar o pneu com o carro andando.
Em isolamento a relação abusiva e violenta do cotidiano que sustentamos pelos mais variados motivos, pesou e tem matado mais, inclusive. Permanecemos com nossos filhos em casa, sem repertório de divertimento. O diploma de magistério quem não tinha precisou criar. Sem termos noção de como será a volta as aulas e se elas vão acontecer, ele precisará ser reinventando.
O trabalho remoto, mesmo com o relaxamento das regras da quarentena, cada dia cresce mais na tentativa de garantir uma economia que possa dar conta de um momento sem precedentes e como se não bastasse a louça da pia, a roupa pra lavar, a comida pra fazer são intermináveis.
Fato é, que aqui estamos e os responsáveis também. Fato, é que temos uma dificuldade congênita de se entregar ao que está acontecendo. Fato é, que amanhã, não
será talvez como na música, é de verdade não sei. Fato, é que a angustia cresce em cada um de nós, aumentando a onda de achar culpados, responsabilizar os donos do poder e a história.
A nova narrativa parte do olhar para trás e para o mundo. A varinha mágica, a bola de cristal, dificilmente trarão respostas. Os astros podem apontar caminhos, mas poucos acreditam neles, pena. O que vai construir novos caminhos, são novas atitudes, novos pensamentos, ou melhor, abrirmos mão de verdades individuais em detrimento de verdades coletivas, é darmos lugar aos saberes ancestrais da terra e dos povos, é dividir o pão e compartilhar o fruto, como canta tão lindamente Milton Nascimento.
Tá na hora de voltar pra dentro e retirar de lá o melhor olhar para o outro, atitudes simples como usar máscara, respeitar o isolamento e não pressionar a máquina para voltar a normalidade. Porque já percebemos que não será dessa maneira que vamos minorar os estragos do Covid-19 em nossas vidas, muito pelo contrário, o aumento do número de ocupação de leitos e de mortes estão aí para comprovar, que atitudes iguais não resolvem novos problemas.
Umas das características desse vírus é a simplicidade, a começar do contágio em contrapondo a teia de complexidades que a humanidade se tornou.
Tão simples quando a oração é também rogar aos céus e acender velas, para que haja luz na consciência dos homens e assim nos tornarmos Humanidade.