Lideranças asseguram: ter um teleférico não é prioridade para a Brasilândia

A edição de 14 de maio do programa “Comunidade em Foco”, na rádio comunitária Cantareira FM, voltou a debater o projeto da Prefeitura de São Paulo de construir um teleférico no Distrito da Brasilândia.

O projeto é que o teleférico tenha 4,6km de extensão, sendo composto por quatro cabines, com capacidade para até dez pessoas em cada uma. A Prefeitura afirma que com isso será possível transportar até 3,2 mil passageiros por hora em cada sentido. Esse modal partiria da futura estação Brasilândia da Linha 6 do Metrô, com uma parada na Avenida Cantídio Sampaio (uma das que mais congestionam na região nos horários de pico) e chegada ao CEU Paz.

Para tratar sobre o tema, os apresentadores Adão Alves e Juçara Terezinha receberam nos estúdios as lideranças comunitárias Maura Cristina, do Jardim Paraná; e Emídio Vicente Neto, do Jardim Elisa Maria; e de modo on-line também participou Fabíola Silva, do território Tribo, do Jardim Damasceno. Nestes bairros há poucas opções de ônibus e lotações e esses veículos circulam lotados, especialmente nos horários de pico.

UM PROJETO SEM DIÁLOGO COM A COMUNIDADE

Juçara recordou que o projeto do teleférico foi anunciado sem qualquer tipo de debate com a comunidade local, algo também ressaltado por Maura e Fabíola.

Maura disse que a população ainda tem muitas dúvidas sobre os custos para instalar e manter o teleférico, além de incertezas sobre se haverá desapropriação de casas e do impacto social e ambiental da iniciativa. “Este projeto não tem clareza, por isso estamos preocupados”, comentou.

Fabíola afirmou que o poder público não discutiu o projeto do teleférico com a comunidade, e ressaltou que a instalação desse modal de transporte na região só seria válido se viesse junto com outras iniciativas. “Todos nós estamos muito abismados em ver lançarem este projeto do teleférico de qualquer maneira. O teleférico até poderá ser algo bom, se vier em um pacote de medidas sociais que antes precisariam ser tomadas, como o combate às enchentes, as questões de habitação”, enfatizou.

“É preciso pensar em um conjunto de ações no território destes bairros que ficarão no raio do teleférico, para que haja sentido em fazer sua instalação. Em qualquer lugar que ele seja instalado, vai ter impacto ambiental e isso precisa ser discutido. Como é isso de só abrir a estação e não se pensar no projeto do entorno? Não foi feito um projeto do poder público junto com a comunidade”, afirmou Juçara.

HÁ OUTRAS PRIORIDADES

Durante o programa, os moradores lembraram de outras urgências sobre as quais o poder público deveria se atentar antes de falar na construção de um teleférico. Um deles, segundo Emídio, é sobre os córregos que transbordam facilmente na região, alagando ruas e casas, e que tem feito a comunidade local pedir para que sejam canalizados, por ora uma demanda sem respostas.

Fabíola e Maura também apontaram as enchentes como o problema mais grave a ser resolvido, assim como a instalação de mais unidades básicas de saúde e de uma UPA na região, dado os recorrentes relatos na demora nos atendimentos. Comentaram ainda que a habitação, para as famílias que vivem em áreas precárias, também deve ser uma prioridade de ação do poder público.

Já Juçara trouxe a preocupação com os recorrentes crimes ambientais que estão sendo feitos na Serra da Cantareira, com frequentes relatos de moradores que veem suas casas ou hortas comunitárias devastadas por entulhos das empreiteiras. Ela também listou como prioridades as questões de segurança pública, a atenção aos idosos e a geração de oportunidades aos jovens.

GARGALOS NO TRANSPORTE

Ser contra a instalação do teleférico sem haver diálogo com a comunidade não significa, porém, que estas lideranças estejam alheias aos problemas de transporte público nos bairros da região. Durante a entrevista, todos lembraram que as lotações e ônibus demoram a passar, quase sempre estão cheios e têm trajeto muito extenso.

Adão disse, por exemplo, que as linhas de ônibus que hoje passam nas localidades mais para dentro dos bairros não chegam aos hospitais da região.

Já Emídio mencionou que uma das linhas que atende o Jardim Elisa Maria fica lotada já ao carregar os passageiros no segundo ponto, e que, diante disso, a comunidade pediu a extensão da linha de ônibus 209P – Pinheiros/Cachoeirinha, para que faça o percurso até o fim da Avenida Inajar de Souza. Hoje, o itinerário termina nesta mesma avenida, mas há poucos metros do terminal de ônibus.

“Essa mudança ajudaria a tirar os ônibus grandes da Avenida Inajar; eles não teriam mais que fazer manobra no meio da avenida, atrapalhando o trânsito; também atenderia mais bairros, como o Jardim Peri; traria uma opção de transporte à comunidade do Futuro Melhor, e levaria o pessoal mais perto da Fábrica de Cultura”, detalhou Emídio, que ainda propôs que se canalize alguns córregos para que a Avenida Inajar de Souza possa chegar até o bairro de Taipas, desafogando o trânsito da Avenida Cantídio Sampaio.

Adão Alves endossou a ideia de Emídio quanto à extensão da linha 209-P, explicando que assim menos pessoas precisariam se valer das lotações para chegar ao destino final: “Isso apenas rodando mais 2 quilômetros do atual trajeto, em um trecho da avenida em que hoje não há grande congestionamentos. Com isso, o ônibus articulado chegaria até o pé do morro do Jardim Peri e as linhas de lotação poderiam partir de lá pra dentro do morro, fazendo todo o acesso via bilhete único”.

Juçara também lembrou ser ineficiente que uma lotação tenha de fazer grandes trajetos: “Por que você é obrigado a pegar uma lotação no Jardim Paraná pra ela te levar até o Terminal Cachoeirinha? Daria pra fazer uma ponte, na parte baixo do Damasceno e agilizar o transporte. Hoje a lotação sai do alto do Jardim Paraná, tem que percorrer toda a parte baixa do Damasceno até ir para a Avenida Cantídio Sampaio. Se houvesse lotações saindo das partes de baixo e de cima facilitaria o transporte, além de melhorar a circulação na Cantídio”.

PRIMEIRO ‘A MASSA’, DEPOIS A ‘CEREJA DO BOLO’

Juçara apontou, ainda, para outras questões da mobilidade urbana na região. “Não temos boas calçadas, nem um largo espaço para andar. Um cadeirante, por exemplo, não consegue circular em nossas ruas, e não vemos preocupação do poder público em relação a isso”, disse, recordando haver poucos ônibus com piso rebaixado na região.

Juçara metaforizou que há todos estes ingredientes que formam uma grande massa de problemas que devem ser priorizados; e Emídio complementou: “O teleférico seria a cereja do bolo, mas a gente não tem o bolo, aliás, nem a farinha, nem o ovo, nem nada”. Ele fez um apelo para que a comunidade participe ativamente na definição das políticas públicas.

Por fim, Adão disse que os microfones da Cantareira FM estão abertos para que a Prefeitura explique a proposta, “principalmente a questão de impactos ambientais e sociais”.

A seguir, assiste a íntegra da live do programa Comunidade em Foco