Gestora ambiental Bianca Forti defende desenvolvimento que não destrua a natureza

Moradora da Serra da Cantareira há 35 anos e ex-presidente do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente de Mairiporã (SP), a gestora ambiental Bianca Forti foi a entrevistada da edição de 18 de junho do programa “Ambiente por Inteiro”, apresentado por Paulo Jofre na rádio comunitária Cantareira FM.
Com a experiência de quem integra dois grupos de pesquisa acadêmica sobre questões do clima nas cidades, de dona de uma empresa que presta serviços de consultoria ambiental, de voluntária no comitê de bacias do Alto Tietê e de conselheira consultiva do Conselho do Parque Estadual da Cantareira, Bianca assegurou que a melhor convivência com o meio ambiente traz ao ser humano melhorias em suas condições de saúde, tanto física quanto mental.
Entretanto, segundo ela, este é um desafio permanente, uma vez que historicamente, desde a época da colonização até hoje, “as pessoas entendem que o desenvolvimento de uma cidade significa construir mais, lucrar com as construções, trazer mais gente. No entanto, não precisa ser sempre assim. Há outras formas na perspectiva do desenvolvimento sustentável, em que é possível transformar sem destruir tudo só para colocar mais gente em um local”, afirmou, criticando a intensa verticalização nas grandes cidades do Brasil.
“O ser humano, infelizmente, criou formas de desenvolvimento que estão trazendo impactos negativos aos recursos que a natureza nos oferece”, ressaltou, lembrando que este modelo – visto especialmente nas cidades maiores – afasta as pessoas umas das outras, diferentemente do que se vê em pequenas localidades, nas quais há mais laços de relacionamentos e relações mais amigáveis, além do fortalecimento das culturas locais.
Realidades da Serra Cantareira

Jofre e Bianca recordaram que a partir da pandemia de COVID-19, mais pessoas se mudaram para a Serra da Cantareira, em busca de um ambiente espaçoso para conviver e de contato mais próximo com a vegetação e a fauna.
“Graças às leis ambientais que há no Brasil, até se deu uma ‘segurada’ no boom de construções e de transformação do uso do solo por aqui”, afirmou Bianca.
Um dos problemas recorrentes na Serra da Cantareira que foi lembrado por Paulo Jofre e comentado por Bianca Forti é o fato de muitas casas não serem conectadas à rede de esgoto e terem fossas sépticas, nas quais se acumulam os dejetos provenientes dos banheiros.
“Todo mundo deveria ter a obrigação de limpar as suas fossas a cada dois anos, conforme é padrão nos projetos para se obter a licença ambiental”, enfatizou Bianca, lembrando haver alternativas para o tratamento desses dejetos antes de irem direto para os rios e matas, prejudicando todo um ecossistema.
“Todo rio tem um tempo próprio para fazer sua depuração, limpeza. Mas quando há muita matéria orgânica sendo jogada ao mesmo tempo no rio, essa grande quantidade de esgotamento sanitário fará com que o rio fique poluído”, explicou Bianca, citando que alguns empreendimentos comerciais na Serra da Cantareira já têm mudado o sistema de fossa séptica para biodigestores, ajudando, assim, a tratar os dejetos antes que vão direto para o meio ambiente.
Outro problema na região da Serra em Mairiporã e adjacências é a grande quantidade de turistas, que circulam pelas áreas de preservação ambiental e de mananciais, sem qualquer tipo de controle de suas atividades.
Bianca compartilhou sua recente experiência de participar de um mutirão para a retirada de resíduos a beira de uma via na Serra da Cantareira: “Foi triste de ver a quantidade que a gente tirou de garrafa long neck de cerveja”. Ela comentou ainda que este tipo de turismo predatório tem prejudicado a região – também pelo fato da grande circulação de veículos – e não raro há atropelamentos da fauna local.
Mudanças climáticas
A gestora ambiental recordou que nos países mais ricos do mundo, como os da Europa e dos Estados Unidos, houve avanços nas leis ambientais, a partir do entendimento da importância do meio ambiente para a saúde pública.
No caso do Brasil, especialmente após a Rio 92, houve o entendimento da sociedade brasileira de que era preciso fortalecer a legislação ambiental, para assegurar a manutenção dos ecossistemas, na busca de um desenvolvimento equilibrado, diferentemente daquele que somente usurpa os recursos naturais, em busca do lucro.
“Há como fazer um desenvolvimento controlado para a região, que redundará em um desenvolvimento sustentável”, enfatizou. Ela deu o exemplo de reservas naturais em outros países, nas quais há limite do número de visitantes, bem como do tempo de permanência, tudo isso para que se evite um turismo predatório.
Sobre o aquecimento global, Bianca Forti disse que a tendência é de piora nas condições: “Os gases de efeito estufa permanecessem um certo período na atmosfera. Assim, mesmo que a gente zerasse qualquer tipo de emissão hoje, ainda levaria um tempo para que a quantidade de elementos químicos de gases de efeito estufa voltasse a um equilíbrio. E hoje pelo modo de vida da humanidade, com a industrialização que vivemos, é impossível zerar a emissão de carbono”, explicou, lembrando que a temperatura média do planeta já está 1,5ºC acima dos níveis pré-industriais e que há grande preocupação de que subirá 2ºC.
Cuidar do ambiente é dever de todos

Bianca Forti pediu que os ambientalistas cobrem do poder público políticas ambientais corretas, e que os políticos se engajem na preservação ambiental.
Neste processo, também é fundamental que a população se envolva, participando, por exemplo, das audiências púbicas do plano diretor estratégico, “que é uma ferramenta de governança que dará as regras de uso e ocupação do solo para as regiões”. Ela comentou que na última revisão do plano diretor em Mairiporã, em 2021, se permitiu a maior expansão de atividades comerciais e de residências na região, o que tende a levar a resultados ruins para o meio ambiente a médio prazo.
Por fim, Bianca fez um apelo: “População, cuide do local onde você vive. Eu tenho visto especialmente em locais com defasagem de serviços públicos – como de coleta de resíduos – que as pessoas convivem com uma situação precária, mas sem fazer muito para tentar reverter isso. Também cuidem das praças para que as crianças possam brincar, ter um ambiente ecológico saudável. Tentem aumentar as áreas permeáveis de floresta, pois isso vai trazer uma qualidade climática para seus bairros, e cobrem seus direitos e as devidas políticas públicas”.
O programa “Ambiente por Inteiro” é apresentado por Paulo Jofre na rádio comunitária Cantareira FM, às quartas-feiras, às 12h05, com reprise aos sábados, às 7h. Abaixo, assista a íntegra da edição de 18 de junho.