‘Comunidade em Foco’ debate o afastamento de diretores de escolas municipais

Sob a alegação de que o desempenho dos estudantes em avaliações externas foi abaixo do esperado, a gestão Ricardo Nunes afastou, em 23 de maio, 25 diretores de escolas municipais e os obrigou a fazer um curso de atualização. No dia 29 do mesmo mês, a Secretaria Municipal de Educação chegou anunciar que recuaria da decisão, mas manteve a convocação dos diretores aos cursos de atualização.

O assunto esteve em pauta na edição do programa “Comunidade em Foco”, em 28 de maio, apresentado por Juçara Terezinha e pela educadora Simone Preciozo, que já atuou como diretora de escola.

FALTA DE QUALIFICAÇÃO OU PROJETO DE PRIVATIZAÇÃO?

Juçara recordou que alguns diretores somente souberam do afastamento ao chegar à sua escola para trabalhar, sem terem sido comunicados previamente.

Simone, por sua vez, chamou a atenção para as similaridades nos perfis dos afastados: “Eles são diretores que mantêm nas escolas projetos com a comunidade, que acolhem alunos refugiados e imigrantes”. Ela também lembrou que a Secretaria Municipal de Educação não está seguindo todos os ritos para fazer tais mudanças. “São atos que caracterizam ilegalidade”, enfatizou, explicando que, por isso, alguns diretores já foram ouvidos pelo Ministério Público.

A apresentadora e educadora enfatizou que nenhuma das qualificações que a Prefeitura pretenda oferecer a estes professores trará algo que eles já não tenham ciência, haja vista que são mestres, doutores e pós-doutores: “Não se justifica que se fale que há falta de qualificação acadêmica e profissional destes professores”.

Para Simone, não é a suposta falta de qualificação a verdadeira justificativa para os afastamentos: “Estamos acreditando que a Educação será privatizada no município, assim como a Saúde já foi. Este é o grande projeto da Prefeitura, além da educação cívico-militar, que será um projeto para as regiões periféricas, para se criar um comportamento de obediência. Esperam que o povo seja obediente a tudo”, lamentou.

Simone também ponderou que a nota obtida por estas 25 escolas no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) não deve ser o único parâmetro para avaliá-las, haja vista que muitas delas se caracterizam por um fluxo flutuante de estudantes, como os filhos de migrantes, de modo que não há tempo hábil para se estabelecer um planejamento de ensino que resulte em boas notas no Ideb.

“O Ideb é um índice controverso e que não deve ser o único critério para avaliar uma escola, muito menos para punir diretores”, insistiu Simone,

Juçara, por sua vez, cobrou que a Prefeitura dê oportunidade para que os diretores expliquem por que suas escolas tiveram notas baixas e que também se avalie os fatores sociais que possam estar impactando no processo de aprendizado dos alunos.

APOIO DOS PAIS

Via chamada de vídeo, a senhora Silvana, mãe de um estudante da EMEF Espaço Bitita (antiga EMEF Infante Dom Henrique), no bairro do Canindé, relatou que a comunidade está solidária ao diretor injustamente afastado. A unidade escolar em sua gestão já foi até reconhecida pela Unesco pelo bom acolhimento que faz aos migrantes e refugiados.

Silvana disse não ter dúvidas de que a real intenção da gestão Ricardo Nunes é retirar os diretores destas escolas para poder privatizá-las depois, pois a descontinuidade dos projetos em curso levarão a resultados ainda piores: “A escola mantém muitos projetos com os alunos a partir da atual direção. Se tirar o diretor, todos estes projetos farão falta à comunidade e para as crianças”.

Os pais e alunos da EMEF Espaço Bitita já realizaram manifestações contra o afastamento do diretor, que está à frente da escola por 15 anos. “Qualquer mãe que vocês entrevistarem falará bem do diretor. A escola sempre está de portas abertas para o que a gente precise falar com o professor e com o diretor, basta ir lá e marcar horário”, ressaltou.

QUEREM ACABAR COM A GESTÃO PÚBLICA DA EDUCAÇÃO

Diretor afastado da EMEF Caio Sérgio Pompeu de Toledo, na Cidade Tiradentes, o professor Carlos Cardoso também participou do programa de modo on-line, logo após ser ouvido em uma oitiva pelo Ministério Público.

“A Prefeitura está se servindo de um subterfúgio que não tem embasamento científico para poder atacar escolas específicas. A intenção desta Prefeitura é clara: acabar com a gestão pública da educação, e, fazendo isso, acabar com o conceito de gestão democrática”, sublinhou.

Carlos Cardoso disse ainda que o prefeito Ricardo Nunes e o secretário municipal de Educação, Fernando Padula, nada conhecem de Educação, por isso tem agido para destruí-la. “A educação de verdade não se dá para mensurar com nota”, ressaltou. Ele apontou que educar envolve olhar o aluno como sujeito, como alguém que tem vontade, desejo, “ou como bem disse Paulo Freire e muitos outros antes dele, ‘o aluno somente aprende se quiser’. A nós, professores, cabe achar os meios para que eles queiram aprender, e o que é basilar para isso é o vínculo afetivo, pois é uma relação entre sujeitos, professor-estudante”.

Para Carlos Cardoso, ele e os demais diretores afastados já obtiveram a vitória moral de ver a mobilização da maior parte da sociedade – incluindo os pais e os estudantes ­– a favor deles: “O que foi construído, o afetivo, e o ideário de uma escola realmente integral – o que não é tempo estendido – não irão conseguir destruir nas nossas crianças e professores”.

Por fim, Simone Preciozo opinou que em vez de afastar diretores e obrigá-los a fazer um curso, a Prefeitura deveria levar até as escolas onde eles estão os ditos especialistas para que, juntos, possam pensar em soluções para os problemas apontados que estão sendo utilizados para justificar os afastamentos.

ASSISTA A ÍNTEGRA DA LIVE DO PROGRAMA ‘COMUNIDADE EM FOCO’