Coletivo Paulo Freire apresenta ‘Cadernos de Educação’ no programa ‘Manas e Manhãs’

Com o objetivo de manter vivo o legado do educador Paulo Freire e fazer com que seus ideais continuem a incidir na educação brasileira, o Coletivo Paulo Freire lançou os “Cadernos de Educação”, com reflexões e relatos de experiências feitas à luz da práxis freiriana.

Na edição de 18 de abril do programa “Manas e Manhãs”, apresentado por Simone Preciozo na rádio comunitária Cantareira FM, cinco membros do Coletivo Paulo Freire, que participaram da elaboração do material, falaram sobre os propósitos da iniciativa e do histórico do grupo.

AS ORIGENS DO GRUPO

Maria de Lourdes explica as origens do Coletivo Paulo Freire

Maria de Lourdes Roque, professora da rede municipal e que trabalhou na gestão de Paulo Freire na secretaria municipal de Educação no governo de Luiza Erundina (1988-1992), recordou que a própria ex-prefeita, Daniel Cara e Nita Freire, viúva do grande educador, lançaram a frente em outubro de 2017, com o nome “Coletivo Paulo Freire por uma Educação Democrática”, em um período no qual o Brasil vivia as instabilidades políticas após o impeachment da presidente Dilma Rousseff e quando a extrema direita se articulava para tirar de Paulo Freire – morto em 2 de maio de 1997 – o título de patrono da Educação Brasileira.

Após o lançamento de um manifesto, mais pessoas se uniram ao Coletivo. Em 2019, um evento celebrou os 30 anos do ingresso de Paulo Freire no comando da secretaria municipal e a partir daí houve uma crescente de encontros on-line e entrevistas que fortaleceram a atuação do Coletivo Paulo Freire.

“Hoje, estamos em um número grande de pessoas, divididas em seis regionais na cidade, e há três grupos de trabalho: GT de Formação, GT de Comunicação e GT de Observatório. Todo este trabalho tem dois grandes objetivos: a defesa da escola pública e a defesa do legado de Paulo Freire”, explicou Maria de Lourdes.

OS PROPÓSITOS DOS CADERNOS

Meyri Venci Chieffi, pedagoga e que atuou como diretora de ensino na gestão Paulo Freire na secretaria municipal de Educação, destacou que os “Cadernos de Educação” buscam difundir os conceitos freirianos perante o atual contexto de uma educação influenciada pelos ideais neoliberais.

“Nestes Cadernos, trazemos as concepções de Paulo Freire que nós sempre acreditamos e aquilo que sempre lutamos e desenvolvemos nas nossas práticas, na perspectiva de uma educação emancipadora, dialógica e pela autonomia dos sujeitos, sejam eles professores, sejam alunos. Produzimos um material que vai na contramão dessa hegemônica concepção neoliberal que está presente hoje na maior parte da política educacional”, explicou.

Meyri detalhou, ainda, que os “Cadernos de Educação” trazem reflexões sobre temas da vida escolar com uma linguagem compreensível a professores, pais e estudantes, e tratam de práticas pedagógicas que dialogam com os conceitos de Paulo Freire e sua incidência em temas do currículo escolar, financiamento da educação e da gestão coletiva da escola.

“Este não é um material que se proponha a apresentar respostas, mas que ajuda as pessoas a refletir”, explicou Meyri, lembrando que há muitos relatos de experiências nos “Cadernos de Educação”.

A PRÁXIS FREIRIANA

Participantes do programa

Martinho Condini, doutor em Educação, mestre em Ciências da Religião e graduado em Estudos Sociais e História, é pesquisador de Paulo Freire e escreveu sobre a práxis freiriana neste primeiro volume dos “Cadernos de Educação”.

O pesquisador ressaltou que em seus 60 anos de vida educacional, Paulo Freire conseguiu unir a prática e a teoria, proporcionando uma formação bem diferente da atual educação neoliberal. A práxis freiriana, conforme explicou, tem três conceitos fundamentais: a conscientização, a humanização e a libertação. Difundi-la junto aos atuais professores é um desafio que o Coletivo Paulo Freire se propõe.

“Nosso Coletivo deseja entrar na escola para poder conversar sobre a prática freiriana por meio destes Cadernos, porque nos cursos de licenciatura atuais isso não ocorre mais. Queremos apresentar este conteúdo aos professores como uma ferramenta para refletirmos sobre a educação”, disse.

“Se a educação não for libertadora, só estaremos repetindo os valores e os interesses das classes dominantes, e só estaremos formando estudantes para servir o capital. Por isso, é tão importante que tenhamos o Freire na sala de aula, com a sua prática”, concluiu.  

FREIRE E AS ARTES PARA ADOLESCENTES E ADULTOS NA ESCOLA

Marília Moreno relatou experiências no ‘Cadernos de Educação’

Marília Moreno, que possui licenciatura em Artes e Teatro e é pós-graduada em Arteterapia e Terapias Expressivas, é professora de artes na rede municipal de São Paulo e vem aplicando a filosofia freiriana com adolescentes em uma EMEF, valendo-se de sua longa trajetória com arteterapia e teatro pedagógico, no qual se valoriza a potência de cada individualidade e se trabalha o fazer artístico também por meio da subjetividade humana. 

Nas ações de escrita criativa que já realizou com crianças, adolescentes e mulheres adultas, Marília vale-se da filosofia freiriana para fazer com que os participantes entendam que os textos que produzem são a própria voz, parte de seu ser, de modo que cada um encontre o potencial de sua escrita e não apenas assuma um papel de leitor passivo.

“Temos de respeitar a todos, independentemente da idade, como um ser já formado, não em formação, pois uma criança, por exemplo, está em formação apenas dentro do conhecimento científico, mas aquela alma, aquele ser, aquela individualidade, já existe; trabalhando isso com respeito, estamos trabalhando Paulo Freire sem precisar falar de Paulo Freire”, ressaltou.

Marília recordou, ainda, que também fez este trabalho em salas de alfabetização de jovens e adultos: “Foi bem desafiador, pois o adulto já carrega em si muito medo em se expressar. Com o adulto é preciso sempre aquele ‘vem comigo’, ‘mais um pouco’, ‘vamos lá, eu estou com você’. Trabalhamos neste caso as histórias de vida e a oralidade, histórias de experiências muito doloridas que eles compartilharam, traumas de gente que precisou de ajuda para sair de um trabalho que era análogo à escravidão e que, depois, colocou isso em palavras, poesia, músicas, na maioria das vezes de forma coletiva”.

GESTÃO PARTICIPATIVA

Silvia Terezinha Cardenuto, graduada em História e Pedagogia e mestre em Educação, relata nos “Cadernos de Educação” a sua experiência como diretora escolar, exercida a partir da filosofia freiriana, fomentando uma gestão participativa e democrática.

Ela destacou que uma gestão escolar freiriana é pautada no diálogo, “no olho no olho”, em uma relação humanizada e com a porta da direção sempre aberta, sempre disponível a ouvir e com fácil acesso para a família. “Envolve, também, em como você atende a comunidade ao telefone, como dialoga com a comunidade, ter uma escola onde todo mundo entre e se sinta bem e feliz”, comentou.

Sílvia enfatizou que os “Cadernos de Educação” não trazem respostas prontas, pois cada grupo, cada realidade, demanda uma necessidade específica: “A gestão, em uma perspectiva freiriana, vai atrás de executar sonhos de uma comunidade, de um grupo de alunos. Todos devem sonhar e ir atrás dos sonhos, pois é possível realizar aquilo que se tenha desejo”.

DIVULGAÇÃO DOS CADERNOS

Meyri mostra a capa do caderno

Na parte final da entrevista, Meyri explicou que os “Cadernos de Educação” serão distribuídos gratuitamente a todos que tenham interesse, e que o Coletivo Paulo Freire pretende apresentá-los de modo mais intenso em sindicatos da área da Educação, bem como ir a faculdades para falar sobre eles em cursos de licenciatura e de Pedagogia, para que os universitários possam conhecer de modo mais assertivo sobre Paulo Freire. Além disso, desejam falar com os professores que têm uma prática mais consolidada na rede pública de ensino.

“Temos divulgado os Cadernos nas escolas que conhecemos e nos colocado à disposição para ir conversar com os professores”, disse Meyri.

Os interessados podem se informar no site https://www.coletivopaulofreire.org ou mandar um e-mail para coletivopaulofreire1@gmail.com.

Ao final, todos os participantes agradeceram o espaço concedido pela rádio comunitária Cantareira FM para que pudessem falar sobre os “Cadernos de Educação” e receberam uma expressão de gratidão de Simone Preciozo:  “Enquanto tivermos professores, teremos sonhos”, concluiu a apresentadora.

A seguir, veja a íntegra da live do programa “Manas e Manhãs”.