Cidade Educadora e os Núcleos de Base

por Simone Preciozo
Você sabe o que é uma cidade educadora? Esse conceito foi amplamente discutido e valorizado entre as décadas de 1990 e 2010, como meio possível de proteger o cidadão dos efeitos abrasivos do capitalismo (especialmente o tardio) na vida das pessoas, notadamente as mais vulneráveis. Eu nunca fui a Barcelona, mas quem a conheceu define cidade educadora a partir do que viu por lá na prática.
O Congresso Internacional das Cidades Educadoras, celebrado na mesma Barcelona em 1990, mobilizou prefeituras mundo afora. Luiza Erundina, então prefeita de São Paulo, participou do movimento e assumiu o compromisso de fazer de São Paulo uma das cidades educadoras do mundo. Não houve tempo para realizar ações incisivas. Depois de sua gestão, foram oito anos de Maluf-Pitta que sepultaram essa visão de educação. Marta Suplicy, de 2000 a 2004, resgatou o compromisso a partir do Projeto CEU. Mais uma vez, terminada a gestão, o compromisso ficou adormecido. Mais do que isso: a meu ver, a dificuldade para São Paulo cumprir tal agenda vem de razões até estruturais e antropológicas. O que se pode considerar “cidade” em São Paulo? Megalópole plural, desigual, formada a partir de tantas e diversas culturas, às vezes é parte de um todo globalizado (e a internet acelerou esse processo). Entretanto, em regiões periféricas, a preservação de manifestações culturais e políticas presentes na educação comunitária parece proteger bem mais as pessoas do que a grande cidade.
Na sexta-feira, 14 de março de 2025, a mesma Luiza Erundina, hoje deputada federal, reuniu diversas pessoas em uma grande da PUC de São Paulo com o objetivo de lançar um manifesto chamado “Sementes da Esperança”. Entre parlamentares de partidos progressistas estavam também pessoas que participaram do projeto de cidade que Erundina propôs em sua gestão como prefeita, além de estudantes.

No evento, Erundina, hoje em seus 90 anos, convidou os presentes a resgatar os “núcleos de base”, organizações populares que no passado tiveram um papel fundamental tanto na luta contra a ditadura quanto na proteção do cidadão contra os efeitos do capitalismo. Houve um encontro de gerações, com a presença de jovens estudantes e velhos militantes.
Presente a esse movimento emocionante, vi com que ternura o poder da educação política de uma ação com essa pode ter na vida dos mais jovens. Não pude deixar de relacionar a proposta com o conceito de Cidade Educadora. Acredito que deva haver um ajuste nos limites do que pode ser considerado “cidade” ou “polis”. Talvez devêssemos nos preocupar menos com esse limite e mais com os efeitos de tal educação. Que venham os “núcleos de base” em todos os cantos do país e que levem as pessoas a se perceberem parte de um todo que precisa mudar a relação com a natureza, fazer frente às tendências fascistas da sociedade, pois isso também pode ter o papel fundamental de resgatar os sonhos nas gerações futuras.