‘Ambiente por Inteiro’ destaca as brigadas populares de incêndio florestal

Suas ações são mais notadas quando o incêndio começa a se disseminar pelas matas e florestas e prontamente eles aparecem para contê-lo. Bem antes disso, porém, esses homens e mulheres, de diferentes idades, se preocupam em conscientizar as demais pessoas sobre os cuidados para se evitar a ocorrência de focos de incêndio.

A atuação das brigadas populares de prevenção e combate a incêndio florestal foi o assunto em destaque na edição de 11 de junho do programa ‘Ambiente por Inteiro’, apresentado por Paulo Jofre na rádio comunitária Cantareira FM, desta vez com a participação de alguns integrantes da Brigada de Incêndio Florestal Popular Cachorro do Mato (@brigada_cachorrodomato), de Campinas (SP).

Participaram da live Victor Hugo Penedo, Cristiane Perini e Tiago Lira, o qual recordou que essa Brigada surgiu pelos idos de 2018/2019, época de muitos incêndios florestais no Brasil. Atualmente, a Cachorro do Mato atua para formar outras brigadas, como fez no caso da Brigada de Incêndio Caxinguelê, na Serra da Cantareira, em Mairiporã (SP), da qual Paulo Jofre participa.

“Toda brigada é um trabalho popular, que busca, por meio de um instrumento associativo, fazer uma ação direta para a conservação do meio ambiente, algo fundamental, especialmente considerando as catástrofes climáticas que temos vivido nos últimos anos”, disse Lira, recordando que em 2024, apenas na região de Campinas, foram perdidos cerca de 600 hectares de mata em incêndios.

A preparação do brigadista

Participantes do programa do dia 11

Lira destacou que em muitos lugares do Brasil são as brigadas populares de incêndio que fazem o combate inicial do fogo, já que o aparato do Estado demora a chegar.

“O brigadista deve estar preparado para fazer atendimento hospitalar de primeiros socorros, precisa estar bem fisicamente para esta atividade exaustiva e deve estar preparado psicologicamente, pois ele vê o fogo destruindo as coisas, além da própria adrenalina daquilo que realiza. E, antes de tudo, o brigadista popular precisa ser uma pessoa apaixonada pelo meio ambiente. Do contrário, o que fará essa pessoa entrar no meio do mato para combater um incêndio? Essa paixão pelo meio ambiente é o motor de todo brigadista”, detalhou Lira.

Victor Hugo, que está na brigada desde 2024, já tendo atuado no combate a um incêndio de grandes proporções na Serra dos Cocais, em Valinhos (SP), também reforçou que o brigadista precisa estar sempre preparado, pois “é desafiador ver o fogo consumindo tudo, ter de subir uma serra com uma bomba costal cheia. Portanto, a preparação, a formação, o treinamento são de extrema importância, assim como estar com a cabeça bem organizada”.

Cristiane, por sua vez, lembrou que na brigada popular a lógica é poder contar com as pessoas que em um dado momento estejam dispostas a lutar conjuntamente contra um incêndio. “Está sendo cada vez maior o número de mulheres nas brigadas. E quanto mais pessoas a gente conseguir trazer e instruir, vai ser melhor não só para o meio ambiente, mas para o ser humano como um todo, pois a gente não combate somente o fogo, pois também tira do ambiente a fumaça, ajuda a levar muitas pessoas para os hospitais”, detalhou.

Paulo Jofre também ressaltou que o brigadista “tem de ter presença de espírito, estar equilibrado em seu psicológico, pois passar por uma adrenalina absurda, principalmente o líder da brigada que tem de coordenar todos os colegas, estar com mil olhos ao redor. Também cada brigadista, fazendo o seu papel, tem de tomar todos os cuidados com seu parceiro, já que qualquer descuido pode ser fatal”.

Lira recordou que em 2024 morreram 14 brigadistas e bombeiros durante o combate a incêndios: “Foram 14 heróis que tombaram fazendo a defesa do meio ambiente para todos. Morreram defendendo o interesse coletivo e transgeracional”.

“O brigadista é uma pessoa que dá a vida para poder preservar o meio ambiente, manter as pessoas salvas, os animais silvestres e a flora”, complementou Jofre. Ele destacou, ainda, que o brigadista nunca para de se especializar.

Como montar uma brigada

Victor Hugo comentou que a existência de brigadas de incêndio populares é muito necessária neste período de emergência climática, com grande quantidade de incêndios florestais, por vezes simultaneamente: “As pessoas que conhecem o território são as primeiras que vão para apagar o fogo, de maneira que quanto mais estiverem treinadas e equipadas, mais eficiente será esse combate”.

Cristiane recomendou que os grupos que tiverem interesse busquem informações e apoio com as brigadas populares já montadas, e que consigam voluntários para participar. Ela lembrou que nas brigadas há diferentes funções, não apenas a de combate direito ao fogo, como a de suporte a quem está na linha de frente, de logísticas de alimentação, hidratação, comunicação, monitoramento dos ventos e das demais condições climáticas, bem como o resgate de pessoas e animais. “Tem espaço para todo mundo dentro de uma brigada”, insistiu.

Tanto ela quanto Lira e Victor destacaram que a Cachorro do Mato está a disposição para treinar novos grupos que queiram formar brigadas.

Aumento dos focos de incêndio

Brigada Cachorro do Mato atua em combate a incêndios

Paulo Jofre comentou que falar de brigada de incêndio popular em São Paulo ainda é algo novo, de modo que é preciso que se difundida mais este conhecimento, diante da urgência do tema. Ele lembrou que em 2024 houve mais de 28 mil focos de incêndio no estado. Também alertou que em setembro e outubro é que ocorrem as mais ocorrências, devido o mato estar ressecado.

Victor Hugo recordou que no ano passado, os Bombeiros chegaram a receber mais de mil chamados em um dia para combater incêndios em florestas. “Como se consegue atender uma demanda dessa se não for com o auxílio de brigadas populares com pessoas formadas e treinadas em várias partes do território? Por isso é de extrema importância de que haja várias brigadas em um mesmo local”.

Em São Paulo, segundo Lira, foram registrados 1.666 incêndios em 2023, já em 2024 houve um significativo aumento: mais de 8,5 mil incêndios.

Prevenção: o melhor combate aos incêndios

Todos os participantes da live lembraram que apesar de estar treinados para o combate a incêndios florestais se empenham para que eles não aconteçam.

“As brigadas existem não para querer apagar incêndio, mas para preveni-lo, para que tenhamos nossas matas conservadas. Essa é a nossa luta”, enfatizou Lira. “E se a população está mobilizada e treinada, ela também fará esta fiscalização, falará para as demais pessoas não colocarem fogo no lixo, nem soltar balão. A cobrança começa pelo movimento popular organizado. Então, é uma luta política também”, detalhou Lira.

“A intenção primeira não é a de apagar o fogo – claro que vamos fazer isso -, mas sim que haja um trabalho de prevenção, a manutenção de acervos, e até bem antes disso as questões políticas, a necessidade de cobrança do setor público”, complementou Victor.

Jofre lembrou que muitos dos incêndios começam pela ação humana, para limpar o terreno para diferentes usos, sem qualquer consciência ambiental.

E o poder público de que lado está?

A criação de brigadas populares de prevenção e combate a incêndio florestal está amparada pela lei federal 14.944/2024, que instituiu a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, popularmente chamada de MIF, mas sua regulamentação em segue em ritmo diferente conforme cada estado.

Lira comentou que em Campinas, a Brigada Cachorro do Mato está arrolada pelo Ministério Público e uma promotora de justiça abriu um inquérito para apurar a conduta do coletivo, pois o Corpo de Bombeiros local alega que a brigada não pode atuar no combate ao incêndio.

“A lei do MIF diz que o bombeiro militar deve regulamentar as brigadas, ou seja, fazer os cadastros, saber quem são os brigadistas, o que não significa tolher a participação popular ou criar critérios que impeçam as pessoas de atuar dentro de uma brigada. Estamos em um movimento de convidar as brigadas populares no estado de São Paulo a uma reunião para discutir este decreto do governador que propõe contratar brigadistas temporariamente, e para a regulação do MIF aqui no estado. Estamos buscando apoios na Assembleia Legislativa. Temos percebido que o estado de São Paulo não está organizado para ajudar a comunidade e ainda quer atrapalhar quem faz algo”, lamentou Lira.

Ao final do programa, Paulo Jofre ressaltou ser fundamental que se dissemine o conhecimento da existência das brigadas populares para que mais pessoas delas participem. “Somente o efetivo do Corpo de Bombeiros não é suficiente para dar conta de toda a situação de incêndios no estado de São Paulo”, enfatizou.

O programa ‘Ambiente por Inteiro’ vai ao ar na rádio comunitária Cantareira FM, às quartas-feiras, às 12h05, com reprise aos sábados, às 7h. Abaixo, assista a íntegra do programa de 11 de junho.